TOPOGRAFIA FACIAL E RISCOS DO PREENCHIMENTO

Conteúdo extraído do livro “Ciência e Arte do Preenchimento”, Ed. AGE, 2018.

A face humana foi dividida, a seguir, em áreas onde incidem, preferencialmente, procedimentos de preenchimento. A descrição das estruturas nervosas e vasculares presentes em cada uma delas tem por objetivo chamar a atenção do profissional de saúde para os riscos da manipulação e possíveis complicações decorrentes das características anatômicas encontradas nelas. O mapeamento por zona de risco pode guiar a conduta de preenchimento cutâneo facial, embora conhecimentos mais específicos, relacionados à realização da técnica, se façam necessários durante os procedimentos, em especial no que tange às áreas de injeção e sua profundidade. Implantar fillers em camadas superficiais da pele oferece risco mínimo de reação isquêmica, mas existem nas mais diversas áreas da face e do corpo, principalmente na região glabelar. Todavia, intervenções realizadas na hipoderme ou em plano supraperiostal, podem trazer complicações, por mais que atendam aos imperativos da evolução técnica. A classificação que se segue visa, portanto, a servir de alerta e trazer algum tipo de orientação aos profissionais que trabalham com preenchimentos, principalmente relacionados a danos vasculares.

REGIÃO FRONTAL – Área delimitada pelo traçado de uma linha imaginária acima do supercílio, que começa nas regiões médio-pupilares e segue bilateralmente até a linha de implantação do cabelo. Nessa porção frontal, pele, subcutâneo, músculo e aponeurose juntos têm espessura relativamente fina, apoiada sobre as estruturas ósseas. Aqui, um filler injetado em grande quantidade precisa ficar em plano profundo (justaperiósteo), ou acabará formando nódulos ou marcas lineares visíveis.

REGIÃO TEMPORAL – Área que tem como limite medial, na porção cranial, a linha médio pupilar e, na porção lateral, a linha de implantação dos cabelos. A linha acima das sobrancelhas se prolonga e contorna a borda orbitária lateral para se fechar com o arco zigomático, no limite inferior. Região de grandes riscos em função da passagem da artéria temporal superficial, bem como do nervo e das veias. A injeção de fillers na derme oferece pouco risco, mas no subcutâneo pode ocasionar lesão às veias, formação de hematoma ou equimoses. A estrutura que mais preocupa é a artéria temporal: sua canalização e a injeção intravascular de preenchedores pode levar à necrose tecidual e à embolização do produto, e causar até mesmo uma amaurose. A recomendação, nessa área, é usar fillers na derme, no subcutâneo ou nos supraperiostais. No subcutâneo, muita atenção para a demarcação da árvore venosa visível e das artérias.
Quando há necessidade de volumerização considerável, aplico filler sempre com microcânula de forma bem distribuída abaixo da fáscia temporal, intramuscularmente, mas com frequência associo preenchimento também subcutâneo superficialmente à vascularização quando possível, visando a atenuar a veia aparente, que incomoda alguns pacientes.

REGIÕES GLABELAR E DO SUPERCÍLIO – Limite inferior definido pela parte superior do dorso nasal e a porção medial do supercílio; limite superior conferido pela linha que une segmentos de 1,5 cm das linhas médio-pupilares, na direção cranial. A área do supercílio é aquela coberta de pelos, que acompanha a sobrancelha até sua porção lateral, onde é possível fazer um preenchimento. A levar em conta a artéria supraorbital que aparece através do forame supraorbital e tem origem na artéria carótida interna e a artéria supratroclear, uma ramificação da artéria facial. A região glabelar é muito temida pelos profissionais devido ao risco de oclusão da artéria retiniana e consequente comprometimento ocular. Hoje, já existem 98 casos de isquemia da artéria central da retina descritos na literatura, e deles quase metade por ácido hialurônico, outra boa parte por gordura e apenas dois casos por uso de PMMA. Isso se deve à maior cautela dos médicos que utilizam o PMMA, que geralmente são profissionais com mais experiência no manuseio de microcânulas.
Recomendo cautela no uso de preenchimento para tratar rugas ou cicatrizes na região glabelar, por conta da possibilidade de embolia arterial. Ao realizar o procedimento, é preciso sempre optar por microcânulas e fazer uma aplicação lenta. Na pior das hipóteses, se ocorrer implantação intra-arterial, o produto embolizará para a região frontal e não por retrofluxo para a artéria carótida interna ou central da retina, o que poderia ocasionar comprometimento visual ou até um AVC isquêmico. Vale lembrar que nessa área e na temporal encontram-se artérias eventualmente anastomosadas e com fluxo sanguíneo direcionado a artérias terminais, como a oftálmica e a retiniana. A embolização desses vasos pode causar amaurose imediata e irreversível.

PÁLPEBRA SUPERIOR – Injetar preenchedores abaixo da sobrancelha, em toda a porção superior, para corrigir a deficiência da bolsa de gordura da região ou perda de sustentação que caracteriza um olhar fundo, não está isento de riscos: a artéria palpebral superior irriga a área, em continuidade com a angular. Há pouco tecido de sustentação local bem como a passagem do músculo orbicularis oculi. Abaixo, também se encontram as bolsas de gordura e a glândula lacrimal, com possibilidade de acidente vascular. Há íntima relação entre a área palpebral inferior, o sulco nasojugal e a região nasociliar, onde também se localizam parte da artéria angular, a artéria palpebral inferior e a artéria infraorbitária; daí a possibilidade de provocar uma necrose tecidual ou embolia. Os planos de menor risco para volumerizar essa área são o muscular e o supraperiostal, uma vez que os vasos se encontram abaixo da derme e acima do músculo orbicularis oculi. O procedimento requer, todavia, muito cuidado e precisão e o uso permanente de cânulas.

SULCO PALPEBRAL LATERAL – Incide na porção lateral da pálpebra inferior, sobre a borda orbitária lateral inferior. É por onde passa a veia zigomático-palpebral, cruzando perpendicularmente a borda infraorbital. Há necessidade de mapeá-la, para evitar equimoses e hematomas.

REGIÃO NASAL – Plásticas reconstrutivas ou estéticas podem influenciar a vascularização da ponta do nariz, das narinas, da columela e da fossa canina. As veias nasais laterais se localizam a 2 ou 3 mm do sulco alar e, assim como a artéria da columela, se encontram em profundidade na base nasal, terminando na ponta (plexo subdérmico). Assim, manipular as artérias etmoidais durante uma intervenção cirúrgica aumenta os riscos de acidente vascular oclusivo. Por outro lado, realizar preenchimentos na região, seja para alongar, afinar ou diminuir as narinas, exige implantação de filler em pequenos volumes, o que minimiza os riscos. Existem muitos casos descritos de necrose pegando asa e ponta nasal pelo uso de fillers, estando intimamente relacionado ao uso de agulhas e ao comprometimento da arteria angular, e nem sempre ao preenchimento nasal, muitas vezes por preenchimento no sulco nasogeniano. Verificar também se o paciente já fez rinoplastia ou cirurgia na região do septo: a irrigação sanguínea local pode ter ficado comprometida.

REGIÃO MALAR – Área triangular infrapalpebral, delimitada medialmente pela região nasal até a porção inferior do sulco nasolabial e, a partir desse ponto, por
uma linha imaginária até o arco zigomático. Nutrida por ramos da artéria angular e por outra que emerge pelo forame infraorbitário, juntamente com a veia e o sistema neural sensitivo do nervo infraorbitário, não oferece grandes riscos: sob implante retrógrado, os planos e localização do produto podem ser bem controlados. A injeção em bolus, visando à revolumerização da região supraperiostal, porém, pode ocasionar obstrução do forame infraorbitário, prejudicando a vascularização, e causar necrose neural. O plano médio do subcutâneo torna a injeção de fillers segura, uma vez que as estruturas neurais importantes estão em planos profundos e os principais vasos margeiam a linha lateral da região nasal.

REGIÃO ZIGOMÁTICA – Localizada em plano lateral à malar, abaixo da temporal e anterior à pré-auricular, tem como principal estrutura o nervo zigomático-facial que emerge do forame localizado no osso zigomático, na zona lateral média. Muito cuidado com um complexo arterial importante em planos mais profundos, bem como com a passagem da veia zigomático-palpebral, na maioria das vezes visível com a distensão da pele. Há risco de obstrução do forame.

FOSSA CANINA E SULCO NASOLABIAL – Há relatos de necrose na região (asa nasal, dorso nasal e parte da região paranasal) por conta de embolização ou compressão da artéria em função de injeção de grande quantidade de produto. Os principais vasos presentes são as artérias angulares e parte da artéria labial superior, passíveis de comprometimento, dependendo da altura da injeção do filler no sulco nasolabial.

LÁBIO SUPERIOR E INFERIOR – As artérias labiais superiores e inferiores se anastomosam com as do lado oposto, para irrigar os lábios. A formação desse círculo arterial ao redor da rima da boca é desfavorável às técnicas atuais de volumerização da região. O contorno labial, quando realizado num plano superficial, na pele, na mucosa ou em sua junção, traz poucas complicações. As artérias labiais são curvas, onduladas e podem ser transfixadas. Em geral, os médicos dão preferência a injetar o preenchedor na porção posterior ao músculo orbicularis oris, em campo relativamente superficial, na projeção do limite entre a mucosa úmida e seca dos lábios, para obter projeção anterior e volume. Os hematomas são frequentes e, para evitar sangramento arterial, é preciso fazer uma compressão firme e prolongada do vaso transfixado. Convém recorrer também a compressas geladas.

REGIÃO DA BOCHECHA – Corresponde à região livre e sem fixação, localizada até 1 cm de lado a lado da boca. Nessa região distribuem-se os ramos arteriais oriundos da artéria facial que se dirigem para os lábios, contornando a região nasal e incluindo parte do ducto parotídeo. A perda de volume é comum e frequentemente necessita de correção.

REGIÃO PRÉ-AURICULAR – Área posterolateral no limite da bochecha, a 2cm de distância do tragus. Delimitada pela região zigomática na sua porção superior e pela zona do ângulo da mandíbula a 1,5 cm da borda mandibular, na porção inferior, recebe ramos vasculares profundos provenientes da carótida interna. Outra estrutura muito importante é a glândula parótida, abaixo do tecido subcutâneo. Por isso, muito cuidado ao preencher a região, dando preferência ao plano superficial da pele e ao tecido subcutâneo. Entre essa região e a bochecha, a um terço do ângulo da mandíbula, está o trajeto da artéria facial, que se ramifica para a região perioral e a pré-tragal.

SULCO LABIOMENTUAL – Inclui uma porção em faixa que abrange a área entre o ângulo lateral da boca até 1 cm de lado a lado dele, acompanhando a borda mandibular. A área é nutrida por ramos arteriais que irrigam os lábios superior e inferior e apresenta uma trama vascular venosa superficial importante, com vasos calibrosos. Grande possibilidade de equimoses. Recomenda-se fazer compressão firme e forte por alguns minutos sempre que houver transfixação de vasos.


REGIÃO MENTUAL – Não há estruturas de risco, mas o forame mentual pode receber inadvertidamente injeção de substância, o que comprometeria as estruturas. Na região do sulco labiomentual está o ramo arterial do lábio inferior, o que ocasiona frequentes hematomas ou equimoses.

REGIÃO MANDIBULAR – A posterior se situa entre a borda anterior do masseter e o ângulo da mandíbula, onde se forma uma depressão por onde passa a artéria facial. Preenchedores injetados na pele ou no tecido subcutâneo não costumam traumatizá-la, mas procedimentos mais agressivos, sem conhecimento anatômico, podem provocar lesão mais séria. A região mandibular anterior se localiza a 1 cm do sulco mesolabial e a borda anterior do masseter. Cerca de 1 cm da área labiomentual está livre para a aplicação de fillers destinados a melhorar o contorno facial. Não há estruturas de alto risco.

Ver Capítulos
Introdução

Em busca da fonte da juventude

Primeira Parte: CONCEITOS DE BELEZA

Anatomia ósse da face
Anatomia da pele
Beleza e Atratividade
– Por que achamos alguém bonito?
– Sequência de Fibonacci
– Estética áurea
– Para pensar
Etiologia do envelhecimento
– Como nos tornamos senis?
– Telômeros e senescência
– Isto é surpreendente!
– Vida útil em discussão
– O equilíbrio da imunidade
O envelhecimento cutâneo
– Fisiopatologia
– Achados clínicos
– Medidas preventivas
– A importância do bom-senso médico no tratamento estético
Transtorno dismórfico corporal
– Etiologia
– TDC e procedimentos estéticos
O potencial de transformação dos fillers
– Condições ideais para um bom produto de preenchimento
– O que é o preenchimento
– Lifting X Ressurfacing
– Técnicas de volumetria
O que a ciência promete para o futuro?

Segunda parte: PREENCHEDORES MAIS USADOS

Não permanentes
Permanentes ou não absorvíveis
Características gerais
Polimetilmetacrilato
Ácido hialurônico
MD Codes
Ácido polilático
– Utilização dos fios de ácido polilático
Hidroxiapatita de cálcio
Hidrogel
Silicone líquido injetável
Outros tratamentos associados a preenchimento
– Toxina botulínica
– Laser CO2 fracionado
Adendo: Análise microscópica do polimetilmetacrilato

Terceira parte: O PASSO A PASSO DA TRANSFORMAÇÃO

Uma plástica minimamente invasiva
O instrumental que se usa
O procedimento e a “mão” do médico
Tipos de anestesia
Perigos do procedimento com preenchedores em geral
Topografia facial e riscos do preenchimento
Complicações e como gerenciá-las

Quarta parte: PROCEDIMENTOS FACIAIS E CORPORAIS

Preenchimento facial
Preenchimento das maçãs do rosto
Preenchimento de rugas, sulcos faciais e cicatrizes
Rinomodelação com preenchimento
Preenchimento da mandíbula
Preenchimento labial
Preenchimento do mento
Preenchimento de pálpebras
Preenchimento peitoral
Preenchimento de glúteos
Preenchimento em lipodistrofia
Bioplastia genital
– Bioplastia e técnicas para aumento do pênis
– Bioplastia de saco escrotal
– Bioplastia de glande
– Bioplastia de vulva
– Bioplastia de clitóris
– Bioplastia de reconstrução após mudança de sexo
Poliomielite
Síndrome de Parry Romberg
Tratamento de celulite e irregularidades cutâneas
Goldincision – Tratamento com subcisão e preenchimento com PMMA

Quinta parte: ASPECTOS JURÍDICOS

A Anvisa e os produtos aprovados por ela
Direito e Medicina
A lei e o uso de implantes líquidos
O Código de Ética Médica

 

 

 

Ciência e Arte do Preenchimento é o primeiro livro do Dr. Roberto Chacur. Na publicação, o Dr. Chacur reúne sua experiência para mostrar a ciência por trás do preenchimento e o requinte da arte na hora de trabalhar harmonização facial e corporal.
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